segunda-feira, 28 de maio de 2012

Balduíno IV: o rei cruzado que atingido pela lepra venceu Saladino e o Islã

Vitral do rei Balduino na Basílica de Saint-Denis, França
Vitral do rei Balduino na Basílica de Saint-Denis, França
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
diversos blogs




Balduíno IV foi o último rei de Jerusalém com espírito de Cruzada. Guy de Lusignan, seu sucessor, foi um interesseiro, sob cujo reinado a Civilização Cristã perdeu a posse da Cidade Santa.

Na história das Cruzadas, nada é mais emocionante que o reinado doloroso de Balduíno IV.

Nada, entre os vários exemplos famosos, pode atestar melhor o império de um espírito de ferro sobre uma carne débil.

Foi um rei sublime, que os historiadores tratam só de passagem, o que faz perguntar por que até aqui nenhum escritor se inspirou nele, exceto talvez o velho poeta alemão Wolfram von Eschenbach.

Nem o romance nem o teatro o evocam, entretanto sua breve existência cheia de acontecimentos coloridos forma uma apaixonante e dilacerante tragédia.

O destino sorria à sua infância. Robusto e belo, ele era dotado da inteligência aguçada de sua raça angevina (de Anjou).

Tinha sido dado a ele por preceptor Guilherme de Tiro, que se tomou de “uma grande preocupação e dedicação, como é conveniente a um filho de rei”. O pequeno Balduíno tinha muito boa memória, conhecia suficientemente as letras, retinha muitas histórias e as contava com prazer.

Um dia em que brincava de batalha com os filhos dos barões de Jerusalém, descobriu-se que tinha os membros insensíveis:

“Os outros meninos gritavam quando eram feridos, porém Balduíno não se queixava. Este fato se repetiu em muitas ocasiões, a tal ponto que o arquidiácono Guilherme alarmou-se.

Guilherrme de Tiro descobre lepra no futuro rei Balduino IV
Guilherrme de Tiro descobre lepra no futuro rei Balduino IV
“Primeiro pensou que o menino fazia uma proeza para não se queixar. Então perguntou-lhe por que sofria aquelas machucaduras sem queixar-se.

“O pequeno respondeu que as crianças não o feriam, e ele não sentia em nada os arranhões. Então o mestre examinou seu braço e sua mão, e certificou-se de que estavam adormecidos” (L’Eraclès). 

Era o sinal evidente da lepra, doença terrível e incurável naquele tempo.

Os médicos aos quais foi confiado não podiam sustar a infecção, nem mesmo retardar a lenta decomposição que afetaria suas carnes.

Toda sua vida não foi senão uma luta contra o mal irremissível.

Mais ainda, muito mais: foi testemunho dos poderes de um homem sobre si mesmo e da encarnação assombrosa dos mais altos deveres.

Balduíno IV foi um rei digno de São Luís, um santo, um homem enfim — e é isso, sobretudo, que importa à nossa admiração sem reticências — a quem nenhuma desgraça chegou a destruir o vigor de alma, as convicções, a altivez, as qualidades de coração, o senso das responsabilidades, dos quais ele hauria o revigoramento da coragem.

No fim de 1174, Saladino, senhor do Egito e de Damasco, veio sitiar Alepo. Os descendentes de Noradin pediram socorro aos francos.

Raimundo de Trípoli atacou a praça forte de Homs e Balduíno IV empreendeu uma avançada vitoriosa sobre Damasco. Estas iniciativas fizeram com que Saladino abandonasse seu desejo inicial.

Saladino incendeia cidade, Chroniques de Guilhaum de Tyr, BNF, Mss fr 68
Em 1176 o sultão voltou à carga, e a mesma manobra frustrou seus planos. Balduíno venceu seu exército de Damasco, em Andjar, e trouxe um belo lucro da expedição. Nesta ocasião ele tinha quinze anos.

Apesar de sua doença, cavalgava como um homem de armas, empunhando eximiamente a lança.

Nenhum de seus predecessores teve tão cedo semelhante noção da dignidade real de que estava investido, e de sua própria utilidade.

Percebendo as rivalidades existentes entre os que o cercavam, compreendeu quão necessária era sua presença à cabeça dos exércitos católicos.

Mas que calvário deveria ser o seu! Aos sofrimentos físicos juntava-se a angústia moral: seu estado impedia-o de se casar, de ter um descendente.

Ele não era senão um morto-vivo, um morto coroado, cujas pústulas e purulências se disfarçavam sob o ferro e a seda, mas que se mantinha de pé e se lançava à ação, movido não se sabe por que sopro milagroso, por que alta e devoradora chama de sacrifício.




(Fonte: Georges Bordonove, “Les Templiers”, in “Catolicismo” nº 303)



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2 comentários:

  1. Belíssimo. Esse é um personagem que está começando a me atrair.
    Parabéns ao pessoal do blog.

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  2. José Juarez Batista Leite6 de junho de 2012 às 23:38

    Eis um exemplo típico de Fé viva e atuante que não se detém nos obstáculos.

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