Partida para a guerra, anônimo francês |
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de política internacional, sócio do IPCO, webmaster de diversos blogs |
O senhor feudal é dono de um castelo ― que nossa imaginação põe perto do Reno, do Danúbio, do Sena ou de um lago da Suíça.
O castelo tem sua torre altiva, muralhas, e aos pés duas e três aldeias com suas capelinhas e seus sininhos tocando. Mais adiante a plantação, depois a criação.
Este senhor feudal, pai de numerosa família, chefe de um povinho, rei em miniatura, sai a pé todo armado.
Atrás dele a senhora que chora, mas que anda também com passo firme, as crianças, alguns familiares, o capelão.
Eles passam a ponte: é a partida do guerreiro.
A partir daquele momento, ele deixa de ser senhor para ser vassalo. Ele obedece ordens, não manda mais. A partir daquele momento ele não é um homem que faz a ordem, ele é um homem que derruba as desordens, é um guerreiro.
Este guerreiro vai arriscar a sua vida pelo Santo Sepulcro de Nosso Senhor Jesus Cristo. É algo de único no mundo.
Ele se despede da mulher, dos filhos, dos parentes, beija a mão do sacerdote que ainda lhe dá uma bênção. Depois monta a cavalo, não olha mais para trás.
O vento bate em direção oposta a ele. No alto do elmo o penacho se levanta, ele dá uma esporada e o cavalo some na poeira e na bruma.
Aquela gente se verá ainda algum dia? Ele não morrerá na Cruzada?
E aquela senhora não fica abandonada? Não pode acontecer que os vizinhos cobiçosos avancem no castelo? Que meios ela tem de se defender?
Ela, pequena rainha, como é que ela faz para tocar para frente aquele feudo, mini-reino buliçoso onde todo o mundo quer coisas e pede melhorias?
Ela volta devagarzinho com os filhos para a capela. Ali reza aos pés do Santíssimo, de um crucifixo ou de uma imagem de Nossa Senhora. Reza, volta para casa e começa a vida de uma espécie de viuvez provisória.
O cruzado pensa nisso, mas ele está pensando também no sarraceno terrível que pode cegá-lo, arrancar-lhe o maxilar, perfurar-lhe o coração. Mas também pensa com entusiasmo no dia em que ele chegar a Jerusalém.
Passam-se cinco anos, sete, oito. Ele manda alguma carta para a mulher quando encontra algum ferido que já não pode participar da cruzada e que está voltando e mora nos arredores da terra dele.
Aquela gente sabia ler pouco e escrever mal. Ele manda algumas palavras que significam:
“Estou vivo, estou lutando, estou com o coração cheio. Cristo, por quem eu estou talvez morrendo, vele por vocês”.
Cinco, sete, oito anos depois, um belo dia o cruzado volta. Envelheceu, ficou com a pele toda crestada dos sóis do Oriente, perdeu uns dedos na Cruzada e acha que perdeu pouco quando há gente que perdeu mais. Encontra-se com a família: alegria geral!
Mas, a bem dizer, começam a conhecer-se de novo, porque cada um fez da outra parte um mito durante a ausência. Na volta encontram uma coisa diferente do mito e transformada pelo tempo.
Então é uma nova adaptação, uma nova vida. Mas no cavaleiro há uma coisa que ficou: ele verteu seu sangue por Aquele que é o Redentor dele.
Ele quebrou o poder maometano. Os dedos que ele perdeu pesaram na balança de Deus contra os maometanos.
Ele volta com a consciência limpa e com o desejo de refazer tudo de novo se as condições permitirem.
Túmulo de Roberto de Normandia, catedral de Gloucester |
Não está ligado à palavra "cruzado" uma glória, um esplendor, uma sacralidade que na ordem temporal das coisas não tem superior? É evidente.
Vamos dizer, por exemplo, Lord Nelson, o grande almirante inglês foi tão admirado que quando ele morreu todas as marinhas do mundo puseram luto. É uma grande coisa.
O Príncipe Eugênio, marechal dos exércitos da Imperatriz Maria Teresa da Áustria, era tão venerado pelos guerreiros. que quando alguém pronunciava o nome dele, todos em todos os países do mundo faziam continência. É glória.
O que é isso em comparação com o cruzado que libertou o Santo Sepulcro de Cristo das mãos dos maometanos?
Lord Nelson, Príncipe Eugênio, o que for, tudo passou... O Cruzado ficou.
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Que página interessantíssima. Um dos temas mais incríveis da história são as Cruzadas. Parabéns pela página e continue em frente.
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