segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Simão de Montfort, líder da cruzada contra os heréticos albigenses (II)

Simon de Montfort, batalha de Muret, Herois medievais“Levanta-te e cinge-te da espada”

O Papa, temendo o desaparecimento da Igreja naquelas paragens, incentivou Simão de Montfort a combater tenazmente os hereges:

“Eia, paladino de Cristo, o sangue dos justos clama a ti para que ponhas diante da Igreja o escudo da fé contra seus inimigos! levanta-te e cinge-te da espada”.
Acusa-se de excessos a Simão de Montfort em sua campanha, mas tem-se que levar em conta os usos bárbaros que ainda persistiam de algum modo naquele século.

Sobretudo é necessário ressaltar que a crueldade dos albigenses em seus ataques às igrejas e mosteiros, seu ódio à Religião católica e seu fanatismo religioso causavam justa indignação no ânimo de seus adversários católicos.

Ademais, aquela guerra adquirira ainda o caráter de uma guerra de civilizações,
“pelo ódio que dividia então as duas raças – os franceses do norte e os franceses do sul – tão diferentes pela sua língua, costumes e grau de civilização”.
Se não fosse o valor e a energia de Simão de Montfort, provavelmente a heresia albigense teria dominado não só o sul da França, mas teria se estabelecido na Itália e outros países europeus.

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Simão de Montfort, líder da cruzada contra os heréticos albigenses (I)

Simon de Montfort, selo, Heróis Medievais





Simão IV, conde de Montfort, foi o segundo filho de Simão III e de Amícia, filha de Roberto de Beaumont, conde de Leicester, na Inglaterra. Nasceu aproximadamente em 1150.

Tendo sucedido a seu pai como barão de Montfort em 1181, casou-se em 1190 com Alice de Montmorency, de quem teve três filhos.

Em 1198 partiu para a Palestina com uma tropa de cavaleiros franceses, mas obtiveram poucos êxitos.

Em 1202 participou da IV Cruzada. Mas vendo que seus companheiros se desviavam do fim piedoso que os tinha movido, e tomaram de assalto Constantinopla, separou-se deles e foi para a Terra Santa, onde se cobriu de glória.

Montfort l'Amaury, cidade natal de Simon de Montfort, perto de Pariws, Heróis medievaisAlguns anos mais tarde, em 1209, aderiu à cruzada convocada pelo Papa Inocêncio III contra os albigenses, no sul da França.

Quem eram os albigenses

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Em Alcoraz São Jorge entrou de cheio na luta trazendo um cruzado alemão desde Terra Santa


Em 1096, o exército católico assediava a cidade de Huesca (Espanha). Ele era dirigido pelo rei de Aragão Sancho Ramírez.

O rei tinha construído a cidadela de Montearagón (foto), hoje em ruínas, como quartel geral do sítio da cidade.

Ela fica sobre o morro chamado desde então de São Jorge.

A batalha já havia começado quando chegaram topas muçulmanas desde a grande cidade de Zaragoza.

O rei morreu e tudo virou para o desastre. Foi quando apareceu São Jorge e a batalha foi ganha pelos cristãos.

A cidade de Huesca capitulou, então, ante o novo rei Pedro I.

Uma crônica do tempo relata a miraculosa intervenção do santo comandante cristão:

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

João Sobieski (II), o rei cruzado que salvou Europa

Jan III Sobieski libera Viena do assédio turco
Jan III Sobieski libera Viena do assédio turco
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
diversos blogs




Por volta de 1680, os islamitas voltaram-se contra a Áustria.

“Havia sete anos eles se armavam desde o Danúbio até o Eufrates, desde o Mar Adriático até as Cataratas do Nilo; em todos os portos se embargavam os navios estrangeiros, para passar da Ásia e África à Europa”.

Assim, com uma impressionante armada, “cuja descrição traz à memória a expedição de Xerxes contra a Grécia”,(2) com cerca de 300 mil homens os turcos atravessaram a Hungria, uma grande parte da qual havia sido por quase 150 anos dominada por eles, e encaminhavam-se para Viena.

A situação era alarmante, pois se os turcos dominassem a Áustria, estaria ameaçada toda a Cristandade.

“Foi um momento transcendental na História do mundo; importante como o ano de 732, quando os árabes, diante de Tours, lutavam pelo senhorio da Europa. [...] Pode-se dizer, com razão, que a independência da Alemanha estava nos muros de Viena; a meia-lua plantada de um modo duradouro nas muralhas de Viena teria mudado o curso da História universal”.(3)

segunda-feira, 27 de julho de 2009

João Sobieski (I), o “Invencível Leão do Norte” desfez o poder turco nas portas de Viena

João Sobieski, rei da Polônia, esmaga os turcos nas portas de Viena
Sobieski, o Rei João III da Polônia, foi um dos maiores capitães de guerra do século XVII, e a ele se deve a salvação da Europa ao derrotar os turcos na batalha de Viena.

Ele nasceu em 1624, filho de Jaime Sobieski, castelão de Cracóvia, da pequena nobreza polaca. João e seu irmão Marcos foram educados com o maior esmero. Passaram grande parte de sua juventude em Paris e estiveram na Itália, residindo por três anos em Pádua, onde freqüentaram a Universidade local. Estiveram também na Inglaterra e na Alemanha.

Ambos estavam na Turquia quando, em 1648, à morte de seu pai, tiveram que voltar à pátria. Nessa ocasião os poloneses tinham sido derrotados pelos russos na batalha de Pilawiecz, os dois irmãos quiseram desagravar seus conterrâneos e entraram na liça. Marcos foi feito prisioneiro pelos tártaros, e por eles assassinado.

Terror dos tártaros e herói nacional

segunda-feira, 23 de março de 2009

Fatos que antecederam a Iª Cruzada (III): sinais divinos e bençãos da Igreja

Núncio Apostólico Adhémar de Monteil na batalha da Antioquia leva a Santa Lança
* Os Barões e Cavaleiros juram combater os inimigos da Fé

“Os Barões e os Cavaleiros que tinham ouvido as exortações de Urbano fizeram o juramento de vingar a causa de Jesus Cristo; esqueceram-se de suas próprias questões e juraram combater juntos os inimigos da Fé cristã. Todos os fiéis prometeram respeitar as decisões do Concílio e ornaram suas vestes com uma cruz vermelha de pano ou de seda. (...)

“Os fiéis pediram a Urbano que se pusesse à sua frente, mas o Pontífice, que ainda não tinha triunfado sobre o antipapa Guiberto, e que perseguia com seus anátemas o Rei da França e o Imperador da Alemanha, não podia deixar a Europa sem comprometer o poder e a política da Santa Sé.

“Nomeou o Bispo de Puy, seu legado apostólico, junto do exército dos cristãos. Prometeu a todos os cruzados a remissão de seus pecados. Suas pessoas, suas famílias, seus bens, foram postos sob a proteção da Igreja e dos Apóstolos S. Pedro e S. Paulo. O concílio declarou que toda a violência feita contra os soldados de Jesus Cristo seria castigada com o anátema e entregou seus decretos, em favor dos cruzados à vigilância dos Padres e dos Bispos.

“Urbano percorreu ele mesmo várias províncias da França, para terminar sua obra tão felizmente começada. (...)

quarta-feira, 18 de março de 2009

Fatos que antecederam a Iª Cruzada (II): Concílios de Piacenza e Clermont Ferrand, sermão do Beato Papa Urbano II

Estátua de Urbano II, Châtillon sur Marne* Urbano II convoca o Concílio de Piacenza

“Para responder aos pedidos de Alexis e aos votos dos fiéis, o soberano Pontífice convocou em Piacenza um concílio, a fim de expôr os perigos da Igreja grega e da Igreja latina do Oriente. (...) mais de duzentos Bispos e Arcebispos, quatro mil eclesiásticos e trinta mil leigos obedeceram ao convite da Santa Sé. (...)

“No entretanto, o Concílio de Piacenza não tomou resolução alguma sobre a guerra contra os infiéis. (...)

“Outras razões explicariam o pouco efeito que produziu a pregação de Urbano no concílio de Piacenza. Os povos da Itália, aos quais o soberano Pontífice se dirigia, estavam entregues ao espírito de comércio, e as preocupações mercantis não vão de acordo com o entusiasmo religioso; além disso, a Itália estava fortemente dominada por um espírito de liberdade, que produzia perturbações e levava a negligência aos interesses da religião. (...)

* Um novo Concílio: Clermont-Ferrand

quarta-feira, 4 de março de 2009

Como foram os fatos que antecederam a Iª Cruzada (I)

Portaestandartes do Califa de Bagdã
Situação geral, à época das Cruzadas

A causa inicial das Cruzadas foi a invasão da Terra Santa pelos Turcos seldjucidas.

Este povo originário do Turquestão, região ao Norte da Pérsia, aderiu ao islmamismo e através da "guerra santa" destruiu o império árabe de Bagdad e conquistou a parte asiática do Império Bizantino.

Em 1076 chegaram a ameaçar Constantinopla mas desviaram o objetivo e dois anos depois conquistaram Jerusalém, que estava em poder de muçulmanos árabes desde 636.

Fanáticos e cruéis, os turcos perseguiam os peregrinos: infringiam-lhes mil vexames e até os torturavam. A Terra Santa foi a partir de então fechada para os cristãos.

Cluny e a Reforma Gregoriana

Governava então a Igreja um dos maiores Papas da História: São Gregório VII. Sob seu governo, a Cristandade recebeu um impulso decisivo: a luta que os monges de Cluny travaram, desde o século X contra as desordens (que a partir da desagregação da obra de Carlos Magno assolaram a Igreja e a Sociedade), chegou então a seu período mais épico.

Essa luta gloriosa, sob um Papa admirável, explica o fervor que então se manifestava na Cristandade.

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

São Francisco de Assis e o Direito da Cruzada. IV ‒ esquema do exemplo de São Francisco e o Direito da Cruzada


I – O problema teológico: é lícita uma Cruzada para assegurar a liberdade dos pregadores do Evangelho?

A. Parece que não (São Tomás começa habitualmente com a objeção):

1. Porque Nosso Senhor é o modelo de todas as virtudes – e eu vou por tom mais romântico e sentimental, porque é um argumento sentimental – e entre os atos que Ele praticou não estava o de matar, mas, pelo que não se converta no contato com missionários verdadeiramente santos.

Portanto, se um governo resiste, e o missionário não consegue converter, Nosso Senhor ensinou a derramar seu próprio sangue na flagelação, em vez de inspirar os guerreiros católicos a que derramem o sangue do pobre adversário. Essa é a formulação sentimental errada.

C. Sed contra. Parece que sim:

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

São Francisco de Assis e o Direito da Cruzada. III ‒ o exemplo de São Francisco glorifica as Cruzadas

Segunda vinda de Cristo
Pode se levantar uma objeção contra a Cruzada: Nosso Senhor Jesus Cristo pessoalmente nunca chefiou uma Cruzada.

Ele se deixou prender em vez de pedir às legiões dos anjos que viessem à terra para impedir a Sua crucificação. Então, não seria mais conforme à mansidão evangélica só pregar a palavra de Deus? Será que o homem se tornou tão ruim que ele resistirá à palavra de Deus?

Não seria mais generoso nós esperarmos na bondade do homem e que a palavra de Deus o convertesse?

Aqui está o ponto central do problema das Cruzadas, em termos de doutrina católica.

Mas é verdade que o homem muitas vezes é tão mau que pode recusar a palavra de Deus. Nesses casos, a Cruzada é legítima.

Se o homem nunca é tão mau que recuse a palavra de Deus então a Cruzada não é legítima.

Há um mundo de democrata-cristãos e caterva do gênero, que sustenta que por meio da bondade se consegue tudo, e que basta o missionário ser muito santo para ele converter qualquer pessoal.

De onde então, o uso da violência a favor das missões seria uma coisa injustificada.

O equilíbrio teológico sobre este problema se manifestava no navio que conduziu São Francisco.

Vai o maior dos missionários que se possa imaginar e prega ao sultão. Os guerreiros são movidos por um tão bom espírito que eles preferem as palavras de amor à força. Mas, se houver dificuldade, entra a força. Eles mandam o santo que emprega as palavras de amor. O sultão prova a dureza do espírito maometano. Diante de São Francisco ele começou a se converter, e resistiu.

Cruzados acham o Santo Lenho a caminho de conquistar JerusalemSão Francisco expulso, prova a legitimidade das Cruzadas.

E a glorificação das Cruzadas vem do próprio fato dele não ter vencido.

Então, nem se pode dizer que os Cruzados eram sanguinários, que iam matar ou que tinham vontade de liquidar.

Não! eles preferiam convencer porque Deus não quer a morte do pecador, mas sim que ele se converta e viva. Mas se ele não se converte, se está de má fé, ali está a lança, ali está o ferro, está a guerra. Está perfeito. É o equilíbrio maravilhoso e católico.

É a melhor justificação que se possa imaginar da Cruzada e do espírito das Cruzadas.

São Francisco de Assis, levando o amor na ponta da Cruzada provou que ela era indispensável.

Porque o amor nem tudo consegue, e onde o amor fracassa não há remédio. É preciso entrar a lança.

Essa é a grande lição que este fato nos dá.


(Fonte: Plinio Corrêa de Oliveira, palestra proferida em 16.11.72. Texto sem revisão do autor).

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segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

São Francisco de Assis e o Direito da Cruzada. II ‒ o exemplo de São Francisco e o sultão ilustra o direito a se fazer Cruzadas

Ultima Ceia
Nosso Senhor, quando esteve com os Apóstolos, disse: Ide e pregai por toda a terra, a todos os povos, batizando-os em nome do Padre, do Filho e do Espírito Santo. Aqueles que crerem serão salvos, aqueles que não crerem se perderão.

Isso é um mandato, quer dizer, é uma ordem que Ele deu.

Esse mandamento dava aos Apóstolos e aos sucessores, bispos e padres católicos de todo mundo, em todos os tempos, a ordem de fazer missões. Daí o fato de que Nosso Senhor morrendo, eles se espalharam pelo mundo inteiro. Eles receberam uma ordem.

Mas junto com essa ordem vinha um direito: e o direito era de ir aos países, ainda que os governos não quisessem, pregar nesses países.

E, é uma obrigação para todos os governos, de atenderem à voz dos missionários e de lhes dar liberdade. Não estão obrigados a se converter, mas tem o dever de dar liberdade aos pregadores da Santa Igreja para que possam fazer ouvir a palavra de Deus ao povo.

Isso traz um corolário. Se os missionários têm direito de ir por toda parte pregar a fé, e se um governo nega o direito ao missionário de entrar, as tropas de um país católico têm o direito de marchar contra esse governo e dizer: "nós viemos aqui arrombar a porta que vocês fecharam. Porque contra Deus, ninguém prevalece. Nós estamos fazendo uma Cruzada". Entram a asseguram aos missionários o direito de pregar.

Jesus Cristo à testa dos cruzadosEntão, podemos imaginar oito, dez, cinqüenta cruzados numa praça, e junto com ele um santo, um padre, um missionário, num lugar em evidência, pregando.

E eles com as lanças, ou com armas mais atualizadas.

É teologicamente perfeito.

O que não seria perfeito seria dizer: ou você crê, ou morre. Isso não seria perfeito.

Mas aplicar a força justa a quem quisesse criar obstáculo, pois não, porque ninguém tem o direito de ir contra os desígnios de Deus.

Então a Cruzada é um direito outorgado por Nosso Senhor Jesus Cristo.

(Fonte: Plinio Corrêa de Oliveira, palestra proferida em 16.11.72. Texto sem revisão do autor).

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segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

São Francisco de Assis e o Direito da Cruzada. I ‒ o equilíbrio entre a mansidão e a força


Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
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Do livro “Les Templiers”, do mundialmente reputado historiador francês Georges Bordonove:

Entre a 4ª e 5ª cruzada houve algumas expedições militares contra os infiéis. De uma delas, que aportou no Egito, participou São Francisco de Assis.

Ele, (São Francisco) teve a audácia de se fazer conduzir à presença do sultão, tendo somente sua fé por salvaguarda. O sultão o escutou com a maior atenção, como que subjugado.

Como o bem aventurado Francisco começasse a pregar e ofereceu-se para entrar no fogo juntamente com um sacerdote sarraceno, para assim provar ao sultão que a Lei de Cristo era verdadeira, o sultão respondeu: Irmão, eu não creio que algum sacerdote sarraceno queira entrar no fogo por sua fé.

Depois, temendo que alguns dos de seu exército, pela eficácia da palavra de São Francisco, fossem convertidos para o Senhor, o sultão o fez conduzir, com toda sorte de considerações e em perfeita segurança, ao campo dos nossos, dizendo-lhe por despedida: Reze por mim para que Deus se digne de me revelar a lei e a fé que mais Lhe agrada.

Comentário de Plinio Corrêa de Oliveira:

O mundo estava dividido em dois campos opostos. Essa divisão estava eriçada de espadas e lanças de ambos os lados.

O assalto de TiroDe um lado o mundo maometano, de outro lado o mundo católico.

Nessa situação, uma expedição militar embarca cheia de ardor. Ela vai levando o homem que, para a sensibilidade deformada de nossos dias, é precisamente o contrário do espírito militar: São Francisco de Assis.

O santo da doçura, da ternura, da bondade, que cantava aos passarinhos e chamava o boi e a vaca de irmãos; o santo – para usar uma expressão má, mas que teria seu cabimento aqui – o santo da fraternidade.

Esse santo vai no meio dos cruzados.

Parece que seu contínuo cântico de afabilidade, cordialidade e amor é o contrário da mensagem dos cruzados.

Ele tem esperança de converter o sultão. Ora, converter é muito melhor do que matar. O indivíduo precisa ser completamente doido, precisa ter perdido completamente o espírito católico, para preferir matar a converter. Converter é muito melhor do que matar.

Degolação de um cristãoDe outro lado, converter é, de algum modo, o contrário de matar. Porque se um homem pode ser conversível, para que matá-lo? Dir-se-ia então que São Francisco de Assis ia como companheiro dos cruzados, com o intuito de tornar inútil a Cruzada.

Bem, ele transpõe as fileiras adversárias e vai falar com o sultão.

Nós podemos imaginar a cena. O sultão aparece como um soberano oriental, no luxo enorme– tecidos finíssimos, tapetes magníficos, casas esplendidamente decoradas, espaçosas, soldados prestando armas, doces regalados, harém – tudo quanto o prazer dos sentidos pode proporcionar de lícito e de ilícito, de belo e de feio, de honroso, e de desonroso, o sultão tinha para si.

Podemos imaginar uma sala magnificamente atapetada. Nas paredes há arcadas com arabescos. Ao longe um pátio com uma fonte que deita água perfumada e um jardim com laranjeiras em flor.

Bate o vento e entra o perfume das laranjeiras; ouvisse o canto das odaliscas dentro do harém. Mais no fundo, um minarete poético que se levanta.

Gordalhão, contente da vida, satisfeito, sentado sobre almofadas, com um turbante esplêndido, coberto de joias, um sultão.

Entra para falar com ele um homem que é o contrário. São Francisco de Assis: renunciou a tudo, é o santo do jejum, da penitência.

O sultão é truculento, autoritário, sanguinário, mata por dá cá aquela palha, cercado de escravos que ele maltrata de todos os modos.

São Francisco de Assis é um homem que quando vai aos matos, os passarinhos descem das árvores e pousam sobre os ombros dele para cantar.

Sao Francisco prega aos animais
Vê uma flor, uma rosa, se extasia e glorifica a Deus, é o homem que faz sua felicidade em não ter nada daquilo que é a felicidade do sultão. E que se apresenta com umas sandálias ou talvez descalço.

E aí uma das enormes antíteses, não só daquele tempo mas de todos os tempos, se estabelece: o diálogo de São Francisco com o sultão. Fala-se hoje tanto em diálogo. Isso foi diálogo.

São Francisco começa a falar. Não nos é difícil conceber o estado de alma de um sultão. Quando o homem tem todos os bens do corpo, é o sinal de que ele não tem nenhum dos bens da alma.

Porque depois do pecado original, quanto mais os bens do corpo se multiplicam, tanto mais os bens de alma vão minguando e empobrecendo.

O sultão não tem tranquilidade, não tem alegria, não tem sensação de asseio nem de bem-estar dentro de si mesmo. Ele se sente uma charneca. Tudo em torno dele é belo mas nada lhe agrada. Tudo dentro dele é feio.

Aparece São Francisco e ele começa a sentir uma paz. Ele olha São Francisco e vê que São Francisco o olha com um sentimento que ele nunca conseguiu despertar em ninguém. São Francisco olha com afeto desinteressado. Ele começa a se comover diante das frases de São Francisco.

Se o violino de São Francisco Solano conseguia desarmar os índios, os senhores podem imaginar o timbre de voz de São Francisco de Assis se não faria desarmar um sultão! Por certo e largamente.

O sultão começa a se comover. Começa a se sentir tão comovido, que começa a perceber que está mudando de doutrina e que ele mesmo vai começando a ficar católico.

Massacre dos peregrinos de Pedro o ErmitãoEle tem medo da ação de São Francisco sobre ele, porque ele não quer largar aqueles bens que São Francisco mostra a ele que são efêmeros, secundários, que não são a razão de ser da vida.

Então, ele comete um primeiro pecado contra o Espírito Santo. Porque negar a verdade conhecida como tal é um pecado contra o Espírito Santo. E diz: esse homem é capaz de me converter. Eu vou pô-lo fora.

Vem um segundo receio: eu não vou me converter, mas se esse homem ficar rodando pela cidade, ele vai converter os outros. Esse homem diz coisas tais, dá um tal brilho de verdade a tudo que ele profere, que outros serão capazes de ser menos duros do que eu, e são capazes de se converter. Eu vou perder meus soldados.

Então, ele toma a resolução injusta de expulsar São Francisco de seu palácio, de seu país.

Mas o pecado nele não foi tão ao fundo como se poderia recear. Ele manda, em vez de matar São Francisco, ele manda levá-lo com toda espécie atenções, até o acampamento dos católicos.

Além do mais, ele faz um pedido na hora da despedida: reze por mim para que eu conheça a verdadeira fé.

Pedido que era, de algum lado, hipócrita. Porque, ao se comover, já ou ao menos já começou a conhecer a verdadeira fé. Ele pedia o que já lhe tinha sido dado.

Mas, de outro lado, era um pedido de quem não tinha renunciado inteiramente a, em determinada emergência, seguir a São Francisco. De maneira que é um pedido que tinha um certo lado de bem.

São Francisco de Assis, convento de São Francisco, QuitoE é possível que São Francisco tenha rezado por ele, e não é impossível que, pelos rogos de São Francisco, grande devoto de Nossa Senhora, esse sultão se tenha convertido na hora da morte.

De qualquer maneira, o sultão expulsou São Francisco e essa admirável possibilidade de conversão cessou para o Oriente.

Que beleza seria o sultão do Egito converter-se? Quanto lutou São Luís, quanto lutaram todos os Cruzados para conquistarem o Egito! Que magnífico teria sido se o Egito se tivesse feito católico. A história do mundo poderia ter virado.

A história do mundo dependeu, naquele momento, da alma de um sultão que tinha diante de si um dos maiores santos de toda a história; e que recebeu, com certeza, naquele momento, uma graça enorme.

Porque a simples presença de São Francisco de Assis era uma graça fabulosa. São Francisco de Assis ir, conduzido pelo Espírito Santo, de tão longe visitar esse sultão, é impossível que esse sultão não tivesse recebido nessa ocasião, graças enormes.

Um homem disse não, um palácio se fechou, um país se fechou, a história da conquista do Oriente pelos católicos estava modificada. O Egito nunca haveria de ser conquistado a não ser no século XIX, mas por uma potência protestante: a Inglaterra.

Seja como for, São Francisco voltou para o meio dos cruzados.

Qual é efeito maravilhoso desse fato? Para a história das Cruzadas?

É a justificação teológica mais magnífica do espírito que movia os cruzados e, ao mesmo tempo, das Cruzadas em si.

(Autor: Plinio Corrêa de Oliveira, palestra proferida em 16.11.72. Texto sem revisão do autor).



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